segunda-feira, 20 de dezembro de 2021

20 DE DEZEMBRO DE 2021
DAVID COIMBRA

Uma das tramas mais originais da história

Dia desses, o Fábio Emerim, famoso professor de inglês da praça, me enviou um vídeo em que um jornalista da Fox americana entrevista uma mulher chamada Lora, ou coisa que o valha. Não sei a respeito do quê era a entrevista, mas, no vídeo enviado pelo Emerim, o jornalista cita um trecho da série You em que pessoas são contaminadas por sarampo.

"You", todo mundo sabe, significa "você". Então, quando a entrevistada ouve "você", pensa que o entrevistador está se referindo a ela. E se irrita:

- Eu nunca peguei sarampo! - Sim, eu sei - responde o jornalista. - Estou falando de "Você".

- Mas isso é estúpido! - ela reclama. - Eu nunca tive sarampo!

- Não, Lora - ele insiste. - Estou falando de Você! Você!

- O que é isso? O que você está dizendo?

- Estou falando da série da Netflix!

- Como se chama a série? - Você! Você!

- Eu nunca tive sarampo! O jornalista acaba desistindo da pergunta:

- Não tenho como explicar isso... Parece uma anedota, mas é verdade. Lembrou-me de uma amiga minha que fazia um curso qualquer e, logo no primeiro dia, perguntou para uma senhora que se sentava ao lado dela:

- A senhora pode me emprestar uma caneta? A minha falhou.

- Não tem problema - respondeu a outra. - Mas me chama de tu, tá?

Da próxima vez que minha amiga foi conversar com ela, começou assim:

_ Ô, Tuta, tu sabes o que...

A outra interrompeu: - Eu não me chamo Tuta.

Minha amiga ficou constrangida. Tentou consertar: - Certo. A senhora, por acaso, sabe o que... A outra interrompeu de novo:

- Me chama de tu, tá? Louca. Minha amiga teve certeza de que estava falando com uma louca.

Mas voltando à série You, assisti até essa parte do sarampo, que achei muito interessante e até didático.

Agora uma advertência: se você tiver medinho de spoiler, não vá adiante. Desista dessa crônica e vá ler o Peninha. Mas, se você souber enfrentar os dilemas da modernidade, sigamos juntos.

Vamos lá. 

Essa série, You, acabou me surpreendendo. Fizeram algo que nunca foi feito antes na história da dramaturgia mundial. Sério. É uma virada espetacular na trama, mas que acontece paulatinamente, naturalmente e, o melhor, com verossimilhança. Fiquei encantado com a criatividade do autor. Mas isso não conto, senão estragará um pouco do prazer que você terá ao ver a série. O trecho do sarampo, porém, tenho de narrar.

Ocorre que o filho do casal protagonista pega sarampo. A mãe, desesperada, pergunta ao médico, no hospital:

- Mas sarampo não era uma doença extinta? E ele: - Sim, mas mesmo nesse tempo de covid existem pessoas contra as vacinas, por isso a doença voltou.

Em seguida, ela acaba descobrindo quem são os antivacina que contaminaram seu filho, e as consequências são graves.

Faço esse relato para reforçar que as pessoas que não tomam vacina ou não permitem que seus filhos tomem não são apenas obscurantistas; estão fazendo mal à sociedade.

Venho escrevendo a respeito e sempre recebo manifestações antivacina. É espantoso. E, pior, é impossível argumentar contra essa ignorância convicta. O que me convenceu: diante de tamanha legião de cegos, é fundamental exigir o passaporte vacinal. Fundamental. A lei também serve para proteger as pessoas da sua própria estupidez.

DAVID COIMBRA

20 DE DEZEMBRO DE 2021
+ ECONOMIA

Tendência de mercado

A Termolar, popular fabricante de garrafas térmicas do Estado, ingressa de vez no mercado de produtos individuais. À coluna, a empresa adiantou que prepara para 2022 uma linha voltada ao segmento. Recentemente, de olho na nova tendência, lançou o copo térmico Moove, que promete evitar vazamentos.

O item está "preparando o terreno" para uma nova linha completa. Segundo Ana Carolina Benfica, do setor de marketing e produto da Termolar, a estratégia foi embasada por pesquisa de mercado que considerou diferentes públicos.

- Há muitos copos térmicos, por isso, focamos em um design hermético com isolamento a vácuo para que não haja vazamentos em movimento e uma capacidade de conservação diferenciada, o que faz com que o usuário possa levar sua bebida para todo lugar - comenta Ana.

A startup gaúcha Rocket.Chat, maior plataforma open source de comunicação corporativa do mundo, anunciou o lançamento do aplicativo de integração com o WhatsApp for Business. Head de produto, Renato Becker antecipa que a nova proposta é dar mais flexibilidade às empresas.

Como funciona a integração?

O WhatsApp é utilizado por 2 bilhões de pessoas no mundo - 120 milhões no Brasil. Com mais de 100 bilhões de mensagens diarias, a rede se tornou o canal número 1 de suporte e vendas. Até hoje, o WhatsApp podia ser integrado por um API de terceiro, o que deixa o processo mais complicado e demorado. Com o novo aplicativo, as empresas podem registrar uma conta WhatsApp Business e sincronizar com a Rocket.Chat, aproveitando uma caixa de entrada unificada e simples. Era uma integração esperada havia muito tempo pelos nossos clientes e parceiros. O Whats­App é a razão da conectividade de muitas pessoas. Há poucos anos surgiu o API Business do WhatsApp, só que não é um "fim", é um "meio". Fornece uma comunicação centralizada para empresas, que, sozinha, não é suficiente. Para nós, isso virou um grande fit (encaixe) com o que nos propomos a fazer, que é uma comunicação centralizada, mas em que vários operadores podem contatar consumidores, clientes e parceiros. O grande benefício é esse: usar toda a visibilidade do WhatsApp, em parceria com a nossa solução.

Quais são os diferenciais?

A própria Rocket.Chat suportava uma integração com o WhatsApp, mas não era algo nativo, feito por nós. A gente trabalha em diferentes nichos, desde pequenas empresas até grandes corporações, e percebemos que as empresas precisam de mais de um número de WhatsApp. Só que elas querem continuar tendo uma comunicação centralizada. Querem ter um número para diferentes departamentos. A nossa solução já vem com essa possibilidade de múltiplos números. Mais do que isso, suporta todas as funcionalidades disponíveis na API Busness. Exemplo é o envio de mensagens de template, que são interessantes para vendas e marketing, pois não é necessário esperar o consumidor entrar em contato, é a empresa que assume a forma proativa. Muitas vezes, falamos na experiência de usuário, mas há funcionalidades oferecidas aos desenvolvedores. Eles conseguem conectar seus sistemas em cima da solução da Rocket.Chat e oferecer uma experiência ainda mais customizada.

E a segurança?

A Rocket.Chat, mesmo open source, é forte em segurança e privacidade e propriedade de dados. É muito atrativa para as empresas governamentais. Por ser open source, as empresas sabem o que acontece por trás, sabem que são donas de seus dados, com banco de dados próprios, cujas informações não estão na nuvem, estão na infraestrutura, o que permite total controle. Então temos muitas camadas de segurança. Umas das atratividades do WhatsApp é justamente a confiança das pessoas de que, quando estão falando com uma empresa, sabem que a conta foi verificada e que existe um algoritmo de proteção que nem mesmo o WhatsApp consegue quebrar. A informação compartilhada é segura, e a Rocket.Chat é 100% compatível com isso.

+ ECONOMIA

20 DE DEZEMBRO DE 2021
CLAUDIA LAITANO

Antipolítica

Apertem os cintos, tapem os ouvidos, cancelem a internet, renovem o estoque de ansiolíticos, fujam para as montanhas. Os próximos meses serão selvagens. Ainda mais selvagens.

Segundo a última pesquisa eleitoral do Datafolha, 60% dos entrevistados afirmaram que não votariam de jeito nenhum em Jair Bolsonaro. A boa notícia: 60% dos brasileiros acreditam que nada pode ser pior do que a política do desmonte, do confronto permanente, da ausência de propostas, do descaso com a vida, da incompetência, da mesquinharia. A má notícia: para manter motivada sua base (os 22% que afirmam que votariam nele no primeiro turno), é possível que o presidente acelere na lomba, radicalizando ainda mais o discurso ao depositar todas as fichas que lhe restam na chamada "antipolítica".

Bolsonaro conseguiu eleger-se em 2018 convencendo parte dos eleitores de que sua "antipolítica" se traduziria em uma administração sem corrupção ou toma-lá-dá-cá. Não era verdade, claro, como qualquer um que acompanhava sua trajetória (e a dos seus filhos) já sabia - e ficou impossível de disfarçar desde que seu governo abraçou o Centrão.

Não se pode dizer, no entanto, que Bolsonaro mentiu ao se apresentar como a mais completa tradução da "antipolítica". Não no sentido de romper com os mecanismos da política tradicional, obviamente, mas no da incapacidade de desenvolver o nível mais rudimentar de diálogo. Azar do país que colocou um adulto que age como uma criança mal-educada na Presidência da República.

Um dos exemplos mais recentes da sua "antipolítica" é o vídeo, divulgado na semana passada, em que aparece conversando com empresários da Fiesp sobre a decisão de demitir diretores do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) depois que a instituição interditou uma obra do empresário Luciano Hang, seu aliado. "O que que é Iphan, com ?ph??", pergunta-se Bolsonaro. "Explicaram para mim, ripei todo mundo do Iphan. Botei outro cara lá. O Iphan não dá mais dor de cabeça para a gente".

Bolsonaro agiu da mesma forma com a Polícia Federal, com a Anvisa, com o Ibama, com o Enem? Diante de um obstáculo, sua única "estratégia" é a de derrubar todas as peças do tabuleiro. Não apenas para defender os próprios interesses, o que já seria ruim o suficiente, mas pela incapacidade de agir de forma "política" - no sentido dicionarizado de civilidade, diplomacia, astúcia.

Quando Bolsonaro dizia que ia "fuzilar a petralhada", quando Ratinho sugere "pegar uma metralhadora" para calar a boca de uma deputada, quando um leitor deseja que eu leve "um corretivo" porque não concorda com as minhas opiniões, o que eles estão dizendo, na verdade, é que não gostam do trabalho que dá viver em uma democracia. É também barbárie. Ou, como alguns preferem, "antipolítica". Os próximos meses serão selvagens.

CLÁUDIA LAITANO

20 DE DEZEMBRO DE 2021
INFORME ESPECIAL

Gangorra

Antonio Barra Torres, diretor-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), terminará seu mandato maior do que quando entrou. Se envolveu em polêmicas como a ida sem máscara a uma manifestação com o presidente Jair Bolsonaro, mas depois disse ter se arrependido. Mesmo amigo pessoal de Bolsonaro, manifesta posições frontalmente contrárias ao que diz o presidente. Tem sido um escudo para a atuação técnica da agência. Para a sorte dos brasileiros, tem mandato fixo e não pode ser demitido. Teve novamente postura digna ao defender de maneira contundente os membros da Anvisa que aprovaram a vacinação de crianças de cinco a 11 anos do ataque de Bolsonaro.

Já Paulo Guedes passou de superministro a uma figura cada vez mais sem credibilidade. Caminha para ser lembrado apenas como um personagem folclórico, que entregou quase nada do que prometeu. Mesmo assim, segue fazendo projeções que não se confirmam. O episódio em que disse ter dispensado o Fundo Monetário Internacional (FMI), levando o organismo a encerrar o seu escritório no país, apenas amplia o anedotário que deixará como herança. Criticou o FMI por errar previsões sobre o Brasil. Logo Guedes, com longo cartel de prognósticos frustrados. Mas teve um que ele acertou, ano passado, quando questionado sobre a possibilidade de o dólar ser cotado a R$ 5: "Se fizer muita besteira, ele pode chegar a este nível".

Crianças e covid-19

Números da Secretaria Estadual de Saúde (SES) mostram que, do início da pandemia até a última quinta-feira, o Rio Grande do Sul somou 37 mil casos confirmado de covid-19 em crianças entre cinco e 11 anos de idade. A Anvisa aprovou a vacinação com produto da Pfizer para esta faixa etária também na quinta-feira. Foram 197 hospitalizações e oito mortes no Estado.

Nos EUA, conforme o Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC, na sigla em inglês), já foram imunizadas mais de 7,1 milhões de crianças de cinco a 11 anos com a vacina da Pfizer. Dos eventos adversos registrados, 97% são considerados não sérios (dor de cabeça, febre, vômito e outros). Somente oito casos de miocardite foram notificados. Todos com posterior evolução clínica favorável.

Os dados do CDC são citados pela Câmara Técnica de Assessoramento em Imunização da Covid-19 em nota em que apoia a decisão da Anvisa e sugere ao Ministério da Saúde acatar o posicionamento da agência, para o país alcançar uma maior cobertura vacinal o mais rápido possível. A pasta, no entanto, ainda vai abrir uma consulta pública para decidir sobre a vacinação de crianças, medida já aprovada ou em execução em vários países.

CAIO CIGANA INTERINO

sábado, 18 de dezembro de 2021


 Parabéns a todos os formandos de Ciências Jurídicas e Sociais de 1983 da Unicruz. 38 anos já se foram...

Que venham outros tantos.... Abração a todos....

segunda-feira, 6 de dezembro de 2021


06 DE DEZEMBRO DE 2021
DAVID COIMBRA

Por que errei

Churchill dizia que a política é a habilidade de prever o que vai acontecer amanhã, na semana que vem, no mês que vem e no ano que vem. E ter a habilidade de explicar depois por que nada daquilo aconteceu.

O jornalismo opinativo também.

Escrevi, quatro meses atrás, que o Grêmio não ia cair para a segunda divisão. E, no Sala de Redação, antes do jogo contra o Flamengo, no primeiro turno, disse que o Grêmio venceria e, mais, se livraria com facilidade da zona de rebaixamento.

Preciso ter a habilidade de explicar agora por que só a vitória contra o Flamengo aconteceu. Sim, bem sei que o Grêmio ainda tem chances de se escapar da Série B, se uma fieira de milagres ocorrerem. Mesmo assim, mesmo que escape, errei nas previsões. Porque, pelo time que tem e pela situação financeira do clube, deveria ser tranquilo para o Grêmio escalar até o meio da tabela. Foi este o meu cálculo.

Está certo que há anos venho dizendo que o time do Grêmio é ruim, mas, quando citava essa ruindade, falava em relação aos objetivos do clube de conquistar grandes títulos, de voltar a ser campeão do mundo. Nunca imaginei que o descontrole fosse tamanho, a ponto de enterrar o time nas quatro piores posições do campeonato.

Mas foi. O descontrole foi brutal. Nos próximos dias, confirmando-se a queda, será a primeira vez que um time grande, com os salários em dia, com jogadores caríssimos e com as finanças equilibradas consegue despencar para a segunda divisão.

Quando escrevo "consegue", quero dizer exatamente isso: que a derrocada do Grêmio é uma façanha ao contrário. É como se os dirigentes do clube se esforçassem ao máximo para liquidar com o time. Houve um acúmulo amazônico de decisões erradas, de trapalhadas e de inversão de valores, sobretudo esse último defeito: inversão de valores.

Existe um termo bíblico que se ajusta ao Grêmio dos últimos anos e que pode se ajustar a qualquer pessoa ou empresa: Mamom.

Mamom é a cobiça, Mamom é a avareza, Mamom é a ganância. É o amor ao dinheiro. Em suas palestras, Jesus ensinava: "Ninguém pode servir a dois senhores ao mesmo tempo. Ou vai odiar o primeiro e amar o outro, ou vai amar o primeiro e desprezar o outro. Ninguém pode amar a Deus e a Mamom".

O deus de um clube de futebol é, precisamente, o futebol. O dinheiro é importante para fazer com que as coisas funcionem, mas só para fazer com que as coisas funcionem. Se ganhar dinheiro se torna o objetivo do clube, aquilo não é mais dinheiro; é Mamom. O Grêmio se desvirtuou, tentou servir a dois senhores, e há 2 mil anos sabemos que isso é impossível. Foi assim que o Grêmio sofreu seu terrível revés. E foi assim que fui arrastado ao erro. Não é um consolo, é uma explicação.

DAVID COIMBRA

06 DE DEZEMBRO DE 2021
EM DIA

Queimar barcos. Mudar a vida

Podemos escolher alterar o curso da nossa vida

Há poucos dias li um instigante artigo de Tim Denning, famoso blogueiro australiano que inspira empreendedores pelo mundo e pode inspirar muitas vidas nestes exigentes tempos. Tim lembrou de uma atitude que teria sido tomada pelo conquistador Hernán Cortés, que, em 1519, chegou ao que foi denominado Novo Mundo. Cortés ficou conhecido por ter destruído o Império Asteca, conquistando o atual território do México para a Espanha. Logo que chegou, ordenou aos 600 homens que liderava que queimassem todos os barcos com os quais tinham chegado às Américas.

Queimando os navios, sabiam que não tinham como voltar. Era tomar a ilha ou morrer. O blogueiro usa esse ato para estimular pessoas a reinventar a vida, libertando-se do passado, sem olhar para o que já conquistaram. Queimar os barcos reduz as opções. Significa que temos que apostar tudo. Saber que, em um dado momento, podemos alterar o curso da nossa existência. Estes momentos não aparecem de repente. É preciso investir algum tempo explorando o que mais podemos fazer. A maneira como estamos vivendo é apenas uma. Existem muitas outras.

Experimentar pode nos ajudar a pensar e questionar construções fixas da realidade. Se nunca questionamos nada, ou nunca tentamos atividades diferentes, nossa mente começará a pensar da mesma maneira todos os dias, desconectada da chance de algo novo. Quando descobrimos que há maneiras de viver com menos estresse, menos peso, mais busca de conhecimento e experiência, ao lado de pessoas interessantes e com quem nos sentimos bem, criamos o momento "burn your boats". 

Sempre há a chance de as coisas não saírem como idealizamos. Mas e se funcionar? E se a vida que pensamos acontecesse se ousássemos eliminar as outras opções? Olharmos menos para os riscos e nos permitirmos mais, criando oportunidades. Podemos revisar muitos momentos da nossa trajetória e perguntar: "Como me saí até agora? Como foi e está minha vida? Dei tudo de mim? Queimei os barcos algumas vezes? Ou preferi não me arriscar? O que gostaria de tentar de novo?".

Eu sempre preferi novos desafios, em vez de me arrepender por não ter feito algo diferente. O momento de queimar os barcos faz a vida valer a pena. Abre outras possibilidades nas nossas mentes. Não precisamos ter pressa. Quando tivermos experiência suficiente sobre as possibilidades, podemos escolher alterar o curso da nossa vida. Cada um pode encontrar uma oportunidade para apostar em si mesmo.

ALFREDO FEDRIZZI | CONSELHEIRO E CONSULTOR


06 DE DEZEMBRO DE 2021
OPINIÃO DA RBS

Escolas em condições

O governo gaúcho apresentou há menos de dois meses o programa Avançar na Educação, acenando com um vultoso investimento de R$ 1,2 bilhão na área. Uma das principais promessas contidas era a de exatamente resolver, até o final do próximo ano, todos os problemas estruturais das escolas da rede estadual. É um compromisso, sem dúvidas, ousado. Tanto pela agilidade que será necessária para o governador Eduardo Leite cumprir a palavra, vencendo a morosidade e a burocracia habituais das obras públicas, quanto pelo grande número de colégios que terá de atender.

Foi conhecido na semana passada um levantamento do CpersSindicato que visitou 186 escolas de 60 municípios. É uma amostra pequena dentro das mais de 2,3 mil instituições geridas pelo Estado. Mas as constatações são alarmantes. Foram encontrados prédios sem energia e água, infiltrações, locais com risco de desabamento, salas de aulas interditadas, entre outros problemas, além da escassez de funcionários e professores. 

O mínimo que se espera é que, com a aproximação do período de férias, se agilizem os reparos mais urgentes que podem ser executados com recursos da autonomia financeira das escolas para assegurar condições adequadas para receber os alunos no início do próximo ano letivo e, ao mesmo tempo, sejam iniciados ou apressados os trâmites para as reformas de maior porte, onde forem necessárias.

Os conflitos entre o sindicato que representa os professores estaduais e a maior parte dos governos são históricos. Não é necessária nenhuma perspicácia para compreender que uma das intenções do Cpers, com o dossiê, é fustigar o Piratini e denunciar o que, na visão da entidade, seria um descaso com o ensino. Mas cabe ao governo gaúcho, em vez de rebater o levantamento, utilizá-lo como um subsídio proveitoso para os seus propósitos de melhorar a estrutura física das escolas. Se assim agir, ganham os alunos, os professores e o próprio governo. Ganha a educação. A sociedade também tem o direito de conhecer a realidade e o dever de acompanhar e cobrar soluções.

Melhorar o nível de aprendizado é uma das grandes metas do Estado, por ser uma precondição de desenvolvimento. Com a pandemia, o desafio aumentou, pelo déficit no ensino pela evasão. Ter escolas em condições dignas, para professores, estudantes e funcionários, é basilar para que alunos voltem ou permaneçam nas salas de aula e tenham melhores possibilidades de aprender. Por outro lado, o Estado atravessa um momento financeiro raro nas últimas décadas, com recursos disponíveis para investimentos. 

Assim sendo, não é possível admitir que continuem a existir escolas em situação precária e com falta de recursos humanos. Os obstáculos da burocracia têm de ser contornados. A promessa do governo gaúcho foi clara: resolver todos os problemas estruturais das escolas da rede estadual. O que se aguarda, portanto, é tão somente o cumprimento do anunciado. Espera-se que se agilizem os reparos mais urgentes e, ao mesmo tempo, sejam iniciados ou apressados os trâmites para as reformas de maior porte, onde forem necessárias


06 DE DEZEMBRO DE 2021
INOVAÇÃO

Banco Central prepara moeda virtual para 2022

Programar uma geladeira inteligente para comprar sozinha os produtos que estão faltando ou ter os itens cobrados automaticamente quando são colocados no carrinho do supermercado sem precisar passar pelo caixa podem parecer cenas de um filme futurista. Mas são promessa do Banco Central (BC) para uma realidade não muito distante.

Depois do sucesso do Pix, o BC quer ampliar as formas de pagamento no país com o real digital, ou a versão virtual da moeda. A instituição lançou na semana passada um laboratório para avaliar possibilidades de uso e a capacidade de execução de projetos com o real digital e prevê começar testes até o fim de 2022.

O real digital também tende a facilitar e baratear a criação de contratos de empréstimos personalizados, para poucos dias ou com pagamentos em meses específicos. E ainda pode favorecer a integração com sistemas de pagamento internacionais, permitindo que se faça uma compra em outro país com conversão imediata.

Os testes, contudo, tendem a durar um bom tempo, e a moeda virtual deve demorar mais do que o Pix para chegar ao consumidor. O BC precisará criar um novo ambiente financeiro para colocá-la de pé, com todas as garantias de segurança e proteção de dados dos consumidores.

- É quase como se estivéssemos fazendo mais um sistema financeiro para funcionar acoplado ao que temos hoje - diz o coordenador dos trabalhos sobre o real digital no BC, Fabio Araujo.

Papel

O BC já definiu diretrizes para o real digital, mas espera o resultado do laboratório para fechar o desenho completo. Já está certo que a moeda virtual vai ser "idêntica" ao real em papel, mas só vai poder ser usada em transações eletrônicas e será armazenada em carteiras digitais de instituições financeiras.


06 DE DEZEMBRO DE 2021
CLÁUDIA LAITANO

Casmurro

"Falava em voz baixa, pausadamente e pouco. Trajava-se sempre de preto e usava chapéu coco. Janus de dupla personalidade: complexo racial e orgulho do valor que reconhecia em si mesmo."

O Janus de chapéu coco é Machado de Assis, na descrição de Francisca de Basto Cordeiro, vizinha de porta que conviveu com o escritor na infância. Tradutora de romances como Por Quem os Sinos Dobram e ?E o Vento Levou, Francisca publicou, já com mais de 80 anos, um livrinho chamado Machado de Assis na Intimidade. Não é muito fácil de encontrar em sebos, mas uma alma generosa digitalizou o volume e compartilhou no Twitter alguns dias atrás. Baixei para dar uma espiada e não consegui deixar de lado antes de terminar.

Há biografias muito mais completas e confiáveis, mas nenhuma transporta o leitor para o universo doméstico de Machado de maneira tão singela e sem filtros. O ano da publicação é 1958, mas tudo no livro cheira a final do século 19: os objetos e os personagens, assim como o estilo e o vocabulário. Um autor como Machado de Assis é capaz de fazer o leitor esquecer que está lendo um livro publicado 140 anos antes. Dona Francisca não tinha esse talento todo, mas era observadora e minuciosa. Descreve não apenas Machado e sua Carolina, a portuguesa culta e já madurona com quem o escritor se casou aos 30 anos ("Alta, magra. Tez alvíssima. Não me recordo de a ter visto sorrir"), mas cada detalhe da casa (os modestos móveis de palhinha, o retrato de Madame Récamier na parede) e dos hábitos do casal.

Para a autora, o Machado de sua infância não era o gênio literário, mas o sujeito um tanto casmurro que escrevia quadrinhas para homenagear os aniversariantes e demorava a jogar na hora do carteado. Ficamos sabendo que o escritor era ciumento, gostava de crianças (apesar de não ter tido filhos) e ficou muito abatido com a morte da cachorrinha Graziela. Nada que explique por que Machado é Machado, mas muito para alimentar a imaginação.

Quando o escritor estava para morrer, muitos amigos foram visitá-lo no chalé do Cosme Velho. Inclusive o Barão de Rio Branco, figurão da época, que lhe fez a dupla desfeita de cumprimentá-lo de maneira protocolar no leito de morte e ainda sair quase correndo do quarto para lavar as mãos.

Francisca, já adulta, também foi visitar o velho amigo da família: - Não tinha saudades minhas? - pergunta, com carinhos de filha, segurando suas mãos.

- Estou com saudades da Vida - responde Machado, com a ironia melancólica que qualquer leitor reconheceria.

CLÁUDIA LAITANO

06 DE DEZEMBRO DE 2021
NFORME ESPECIAL

Trabalho por conta própria é recorde no RS

O número de trabalhadores por conta própria no Estado bateu recorde no terceiro trimestre, de acordo com a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Ao final de setembro, eram 1,458 milhão pessoas nesta condição no Rio Grande do Sul. Um aumento de 4,2% sobre o trimestre imediatamente anterior e 11,2% em relação a um ano atrás (ver gráfico abaixo).

Trabalhadores por conta própria podem ser formais ou informais. Os formais são microempreendedores individuais (MEIs). Esta tem sido uma alternativa de colocação no mercado de trabalho diante da geração de vagas com carteira assinada ainda lenta. Tem ainda a vantagem de garantir acesso a benefícios da previdência social.

Com o avanço, os trabalhadores por conta própria passaram a representar 26,2% do total de ocupados no Estado, uma participação também recorde na série história iniciada em 2012. No segundo trimestre de 2021, por exemplo, eram 25,5%.

Já o número ocupados informais, entre todas as categorias, voltou a subir entre julho e setembro no Rio Grande do Sul, mas não é recorde. Chegou a quase 1,8 milhão de pessoas, após cinco trimestres consecutivos girando entre 1,5 milhão e 1,6 milhão. No final de 2019, eram mais de 1,9 milhão de gaúchos trabalhando como empregados sem carteira assinada e por conta própria sem CNPJ, por exemplo.

DO BEM O fim da picada

Enquanto a maior parte das atenções ainda segue voltada à covid-19, o Ministério da Saúde faz outro alerta em relação ao Estado. Vem crescendo a ocorrência de doenças transmitidas pelo mosquito Aedes aegypti.

A pasta observa que, neste ano, já foram registrados cerca de 10 mil casos de dengue no Rio Grande do Sul. É um aumento de 152% em relação ao ano passado. Com isso, é a terceira unidade da federação com o maior variação na quantidade de registros. Algo parecido é observado em relação à chikungunya. São 317 notificações, salto de 560% sobre 2020.

A preocupação aumenta com a chegada do verão, quando o ambiente fica mais propício à reprodução do mosquito. A ordem é dar maior atenção à eliminação dos focos do inseto.

CAIO CIGANA INTERINO

domingo, 5 de dezembro de 2021

 Nova administração assume a gestão do TRT-RS

Cerimonia de posse do novo presidente do TRT-4, desembargador Francisco Rossal de Araújo, contou com a presença de dezenas de magistrados
Cerimonia de posse do novo presidente do TRT-4, desembargador Francisco Rossal de Araújo, contou com a presença de dezenas de magistrados
ANDRESSA PUFAL/JC
Adriana Lampert
A nova administração do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 4ª Região foi empossada no final da tarde desta sexta-feira (3). Eleitos para a gestão 2021-2023, tomaram posse os desembargadores Francisco Rossal de Araújo (presidente), Ricardo Hofmeister de Almeida Martins Costa (vice-presidente), Raul Zoratto Sanvicente (corregedor regional) e Laís Helena Jaeger Nicotti (vice-corregedora).
Na mesma sessão, também assumiram os eleitos para a direção e a vice-direção da Escola Judicial, desembargadores João Paulo Lucena e Fabiano Holz Beserra, respectivamente.
Em seu pronunciamento de despedida da Presidência, a desembarcadora Carmen Izabel Centena Gonzalez citou o período de pandemia de Covid-19 como "o mais crítico para a Instituição em todo o século 21", e destacou a importância de um ambiente "verdadeiramente democrático, transparente e participativo para que todos e todas tivessem espaço para contribuir" para as ações do TRT 4.
Carmen ainda ressaltou que o atual momento "exige reflexão do papel da magistratura", observando que a Justiça do Trabalho é "a única que tem não só competência, mas verdadeira vocação" para solucionar os conflitos entre o capital e o trabalho, a fim de garantir os direitos da Constituição de 1988, a exemplo de "trabalho digno e descente" para a população. 
A magistrada ainda lamentou que, mesmo após 30 anos da legislação, "diariamente se vê nas grandes cidades a quantidade enorme de pessoas em situação de rua e crianças e adolescentes pedintes, entregues à própria sorte." "O desemprego cresce e grande parte da população brasileira vive em situação precária, recebendo menos que um salário-mínimo, segundo recente pesquisa do IBGE", lembrou Carmen, ponderando que o quadro foi agravado por conta da pandemia.
Ao tomar posse como presidente da Casa, o desembargador Francisco Rossal de Araújo também destacou que "tão importante quanto a criação de riqueza, é a distribuição da riqueza. "Estamos aqui por um motivo: pela Justiça do Trabalho, pela ideia do direito social. Por este motivo saímos de nossas casas hoje", afirmou, lembrando que valorização do trabalho e promoção do emprego passam também pela valorização dos sindicatos, tanto os patronais, quanto os de categoria.
"Durante os meses mais sombrios da pandemia, a Justiça do Trabalho foi a casa do diálogo e seguiremos em prol do desenvolvimento sustentável, em proteção ao ambiente laboral e todos os demais, e no combate de atitudes discriminatórias", disse o desembargador. Segundo ele, a instituição irá trabalhar alinhada à Agenda 2030 das Nações Unidas (ONU), voltada para a paz e o futuro viável de toda a jurisdição trabalhista gaúcha. "Precisamos ampliar o debate para o conjunto da comunidade civil, pois ali está a visão que devemos ter para o nosso destino como humanidade na próxima década."
A cerimônia foi acompanhada por dezenas de magistrados, autoridades e juristas, como o presidente da regional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/RS), Ricardo Breier, e a ministra do Tribunal Superior do Trabalho, Maria Helena Mallman. A solenidade também foi acompanhada de forma virtual pela ministra do Supremo Tribunal Federal, Rosa Weber. 

 McDonalds vai abrir na Zona Leste de Porto Alegre e tem mais 3 saindo do forno

Unidade está quase pronta na esquina da avenida Protásio Alves com a Antônio de Carvalho
Unidade está quase pronta na esquina da avenida Protásio Alves com a Antônio de Carvalho
PATRICIA COMUNELLO/ESPECIAL/JC
Patrícia Comunello
Uma nova unidade da rede norte-americana de fast-food McDonalds está prestes a abrir em Porto Alegre. A unidade fica em um dos cruzamentos mais movimentados da Zona Leste da Capital. A inauguração é 1º de janeiro de 2022. Assista ao vídeo a seguir com imagens de como está ficando a unidade.
A coluna também descobriu que no terreno vizinho ao do fast-food será erguida uma nova Panvel.
Com menos de um mês para começar a servir seus famosos lanches, a nova franquia do "MC" registra ritmo acelerado das obras na esquina das avenidas Protásio Alves e Antônio de Carvalho. A região é um dos principais corredores do tráfego entre Porto Alegre e Viamão.
Equipes da empresa que constrói as unidades em todo o País para a Arcos Dorados, companhia que representa a franquia da marca de fast-food na América Latina e Caribe, fazem acabamentos na área de estacionamento, pintura e instalações.
Na área interna da loja, mobiliário, equipamentos, tótens de atendimentos e outros itens da operação já estão colocados, faltando os ajustes e arrumação finais.       
Além desse novo ponto, mais três franquias estão a caminho: duas em Porto Alegre e uma em Canoas. 
Na Capital, será erguido um Mc na esquina das avenida Dom Pedro e Cristóvão Colombo. O terreno já está cercado e com as primeiras intervenções em andamento. A outra ficará no entorno do Shopping Iguatemi. Os novos fast-food são previstos para ficarem prontos até fim de fevereiro. 
Na cidade da Região Metropolitana, vizinha a Porto Alegre, a lancheria ficará em uma área em frente ao Canoas ParkShopping. Também deve abrir no começo do ano.
As vagas para trabalhar na unidade na Zona Leste já estão preenchidas. Mas para as outras três é possível se inscrever pelo site (www.mcdonalds.com.br/trabalhe-conosco) ou entregar currículo no McDonalds da avenida Nilo Peçanha, 2181, próximo ao Iguatemi, na Zona Norte.
Em nota na sexta-feira (3), a rede informou que tem 17 postos abertos no Estado, mas não chegou a indicar onde

sábado, 4 de dezembro de 2021



04 DE DEZEMBRO DE 2021
LYA LUFT

Palavras em colo de mãe

Em criança eu traduzia a lápis na margem dos livros infantis palavras e frases inteiras.

Que estranha vocação precoce de pensar em dois idiomas, porque falava os dois?

Que impaciência que transbordava?

Que encanto em ouvir o jardineiro dizer "transbaldava" em lugar de " transbordava"? Entendi afinal que para ele a água saía pelas bordas dos baldes. Essas coisas triviais me seduziam.

Me perguntam como e quando me tornei escritora. Outra dúvida. Possivelmente quando saiu meu primeiro livro aos 25 anos, mas na verdade sempre escrevi em pensamento histórias para mim mesma, usando e abusando do giro das palavras dentro de mim.

Era meu jeito de ser e continua sendo. Desaparecer nas palavras e repetir: "não queiram me decifrar, não me prendam com o alfinete da interpretação. Se digo flor, é flor; se digo água, é água; corrente de sinais com o meu nome embaixo".

E também ele um dia vai evanescer como umidade nas paredes.

E tudo será silêncio de grande colo de mãe.

LYA LUFT

04 DE DEZEMBRO DE 2021
MARTHA MEDEIROS

Carta aos Beatles

Prezados, esta carta chegará atrasada, com dois de vocês já habitando outro plano, mas como foi sacramentado que a banda é eterna, seguimos juntos.

Quero falar de Get Back, claro, o documentário que está obcecando quem é beatlemaníaco (ia escrever "foi" beatlemaníaco, mas alguém conseguiu deixar de ser?). Lennon quase passou por um cancelamento por ter dito que vocês eram mais famosos que Jesus Cristo (sorte que as redes sociais não existiam), mas o exagero da declaração procede, os Beatles se tornaram mesmo uma espécie de religião, e agora temos a oportunidade de entrar no céu através de uma plataforma de streaming.

Não sabia que o doc seria dividido em três partes e totalizaria sete horas de imagens: a indução ao tédio é um risco, são só vocês quatro num estúdio, dia após dia, criando canções e discutindo o próximo show ao vivo (que viria a ser o último). Eu mesma, lá pela metade da primeira parte, tive que parar porque bateu a fome - coisa mundana, jantar... Mas voltei pra frente da TV e resolvi não esperar pelo fim, já estou aqui remetendo minha adulação nessas mal traçadas.

Não é qualquer banda que cria um gênero musical. Existe o jazz, o blues, o rock, o samba, o hip hop, o forró, os Beatles, o gospel, o bolero. Vocês fundaram um estilo único, sofisticado, de extraordinária inventividade, nenhum disco igual ao outro. Quem não reconhece os primeiros acordes de Yesterday, The Long and Winding Road, Hey Jude, Don?t Let me Down? São duas centenas de clássicos em apenas 10 anos.

Vocês entraram no meu quarto de menina e ofertaram a trilha sonora da minha vida. Quem diria que, mais tarde, eu também entraria na intimidade de vocês, que me sentaria ao lado de George Harrison enquanto ele compunha um riff de guitarra ou que dividiria a banqueta do piano com John Lennon (licença, Yoko). Que perceberia tão nitidamente a calma de Ringo e a hiperatividade de Paul, e como cada um dos quatro lidava com o temperamento do outro, mantendo a elegância até mesmo - ou principalmente - durante as desavenças. Não, nunca foi only rock?n?roll.

Nove de janeiro de 1969: o parto de Let It Be. O privilégio de ver nascer uma obra-prima. A busca pelo tom melódico, pelas palavras certas. Neste dezembro de 2021, esparramada num sofá em Porto Alegre, me vi transportada para a fleumática Londres e virei voyeur de um big bang: o desenvolvimento inicial de canções que atingiram em cheio aquela menina de sete anos que eu fui e que tinha vocês como ídolos intocáveis - e que agora tem a honra de senti-los tão perturbadoramente perto.

Devemos ao diretor Peter Jackson esse presentaço de Natal e a vocês quatro a genialidade que nos legaram. Talvez eu não esteja falando por todos, mas falo por mim, herdeira perplexa de tamanha fortuna, mais beatlemaníaca do que nunca.

MARTHA MEDEIROS

04 DE DEZEMBRO DE 2021
CLAUDIA TAJES

O golpe do amor premiado

"Como posso explicar para você? Não é fácil acordar do coma."

Foi assim que Roberto Cazzaniga, jogador de vôlei italiano, começou a revelar os últimos 15 anos da sua vida em um programa de TV. Quinze anos que ele passou apaixonado pela voz que acreditava ser da modelo brasileira Alessandra Ambrósio, e dedicado a ela - a voz. Quinze anos sendo depenado sem dó nem piedade, por uma voz ao celular. Conta final da brincadeira: 700 mil euros, mais ou menos R$ 4,3 milhões.

Não era amor, era cilada. Mais comum, segundo as estatísticas, é as mulheres serem vítimas do chamado golpe romântico. Algumas são famosas, como a atriz que julgou estar namorando o George Clooney. Quase todo mundo tem uma amiga que caiu na lábia de um conquistador profissional, ou uma parente que, nem aí para os avisos, entregou o que tinha e o que não tinha para um alguém que surgiu do nada.

O soldado que escreve do front porque viu a foto dela no Facebook, o empresário milionário procurando uma noiva, um sheik árabe em busca de uma nova esposa. Nem precisa de muita criatividade. Se até hoje tem gente que cai no conto do bilhete premiado, como resistir a um amor que chega de surpresa em um dia chato?

Amor, aliás, que já serviu até para estragar computador. Há alguns anos, um vírus que tinha por título uma declaração apaixonada chegava por e-mail, e pimba. Não era um príncipe, e sim o técnico de informática que aparecia em casa na sequência.

Roberto, o italiano, começou a cair no golpe em 2007, quando uma amiga - muy amiga! - disse a ele que uma certa Maya, muito bonita, queria falar com ele. Botou os dois em contato pelo celular e, algumas ligações depois, a desconhecida revelou ser a top Alessandra Ambrósio.

A essa altura, um Roberto já muito interessado se apaixonou de vez. Foi quando a falsa Alessandra passou a pedir dinheiro para custear um suposto tratamento para uma doença cardíaca gravíssima. O jogador de vôlei pediu empréstimos para a família, foi aos bancos, vendeu o que tinha para ajudar a amada. Enquanto isso, a verdadeira Alessandra desfilava pelo mundo com o companheiro de tempos, com quem tem dois filhos.

Um dia que o pegou chorando, o irmão de Roberto perguntou, come và, ragazzo? A mulher que eu amo vai morrer se eu não mandar uma quantia tal de euros para a cirurgia, ele respondeu. Mas já não havia o que mandar.

Essa história terminou na delegacia e foi parar no programa de TV, que descobriu que a falsa Alessandra era uma mulher de 50 anos chamada Valéria. Nos 15 anos em que levou Roberto literalmente na conversa, Valéria reformou a casa e criou os filhos. Roberto ainda deve 60 mil euros e os amigos do time de vôlei criaram uma vaquinha para que, conseguindo pagar a dívida, ele enfim consiga seguir em frente.

De onde se conclui que amor é como qualquer tipo de investimento, precisa de um mínimo de segurança. Se aparecer um bilhete premiado, e ainda por cima por telefone, desligue e vá ler um romance, que você ganha mais.

E tem os brilhantes verdadeiros. Dia 8 de dezembro, quarta-feira, um espetáculo com quase 10 anos de sucesso encerra sua carreira no Theatro São Pedro. BR Trans, escrita e interpretada por Silvero Pereira, nasceu da experiência do artista com o universo das pessoas trans e travestis a partir de uma oficina de reinserção que ele desenvolveu no Presídio Central. Ao longo do espetáculo, histórias e relatos de vida se entrelaçam para contar um pouco da realidade do país que mais mata travestis e transexuais no mundo, tudo isso com o talento do Silvero e a participação do músico Rodrigo Apolinário, que faz a trilha da peça ao vivo. Se já é emoção do início ao fim, imagine sendo a última sessão de BR Trans para todo o sempre. Vale muito garantir o lugar. Ingressos à venda na bilheteria do Theatro São Pedro e pela plataforma Sympla.

CLAUDIA TAJES

04 DE DEZEMBRO DE 2021
LEANDRO KARNAL

Muita gente tem férias no final do ano. Como já escrevi, 2021 deixará poucas saudades, e a pausa é merecida e necessária. Quer ver algo interessante? A série coreana da Netflix quebrou a banca: Round 6. Trata-se de uma metáfora do capitalismo similar à obra espanhola O Poço. Em nome do dinheiro, o que cada pessoa está disposta a arriscar? Uma questão muito importante. Um aviso: as cenas incluem violência. Se você acha que já houve coisas fortes demais no ano que se encerra, opte por outras: O Gambito da Rainha, Lupin ou a nova temporada de Lúcifer. Sim, reconheço: ver as aventuras do príncipe das trevas pode nos distrair de 2021... A que ponto chegamos.

Cansado da televisão? Voltemos aos livros: A Vida dos Estoicos - A Arte de Viver de Zenão a Marco Aurélio (Holiday e Hanselman, editora Intrínseca) é a dica certa para você. Celso Castro é filho de um oficial do Exército brasileiro e antropologo. A partir de um trabalho de campo na Academia de Agulhas Negras, ele tenta fazer uma análise distante dos jargões do militarismo ou da visão de mundo castrense. O que seria, na visão fardada, o paisano? Existe mentalidade militar, de fato? A leitura do livro O Espírito Militar - Um Antropologo na Caserna (Zahar) traz luzes sobre essas indagações.

O Oriente Médio tem jeito? Adi Schwartz e Einat Wilf acham que sim. Os dois israelenses fazem reflexões muito distantes da polarização reinante nos dois lados em livro da Editora Contexto: A Guerra do Retorno - Como Resolver o Problema dos Refugiados e Estabelecer a Paz entre Palestinos e Israelenses. Como a questão é complexa, estou buscando uma boa obra similar escrita por um palestino. Alguma indicação?

Como se fala em judicialização do mundo, seria interessante ler o livro de Augusto de Arruda Botelho: Iguais Perante a Lei - Um Guia Prático para Você Garantir Seus Direitos (ed. Planeta). Você insultou alguém nas redes sociais e tem medo de processo? Se prefere continuar no campo jurídico, gostei muito da Biografia Não Autorizada do Direito, de Fábio Ulhoa Coelho (WMF Martins Fontes). Aprecio, em particular, textos que buscam a história de um conceito como esse do Fábio.

Encerro falando de um sucesso: Política É para Todos, de Gabriela Prioli. A advogada lançou pela Cia. das Letras um livro curto e claro para falar de forma crítica de grandes conceitos e práticas do poder e sua administração. Bom pontapé inicial para 2022, que promete ser essencialmente político. Ler como estratégia ou... por vingança contra aqueles que nos governam. Ler é esperança!

LEANDRO KARNAL

04 DE DEZEMBRO DE 2021
DRAUZIO VARELLA

O FURO DA COVID

A atenção dos cientistas está voltada para a disseminação da covid no Reino Unido.

A revista Nature ouviu especialistas do mundo inteiro para discutir esse tema relevante, porque várias vezes a pandemia inglesa precedeu o que veio a acontecer em outros países.

Por exemplo: 1) a variante Alfa foi detectada pela primeira vez no Reino Unido; 2) o país relatou casos provocados pela variante Delta, altamente contagiosa, antes que eles se espalhassem pelo mundo; 3) foi o primeiro país a descrever a onda atual de infecções, que novamente transformaram a Europa em epicentro da epidemia atual.

Depois de implantar um dos programas mais eficientes de vacinação em massa, a Inglaterra foi dos primeiros países a suspender quase todas as restrições anteriormente impostas pela covid. O distanciamento social e o uso de máscaras foram abolidos em julho deste ano.

Apostar todas as fichas na vacinação e na responsabilidade individual fez do Reino Unido um experimento social de interesse para outros países. Apenas entre julho e outubro deste ano (2021), houve 3 milhões de novas infecções no Reino Unido, número comparável ao das que ocorreram no final de 2020, em plena vigência do lockdown inglês. Difícil encontrar explicação, se lembrarmos que, naquela época, não havia vacinas, e que agora quase 80% dos adultos foram imunizados com duas doses.

Os índices de transmissão no Reino Unido são mais elevados do que no resto da Europa. Na semana de 17 a 23 de outubro, por exemplo, a Espanha contabilizou 286 infecções por milhão de habitantes, a Alemanha, 1.203, enquanto no Reino Unido houve 4.868.

Esses dados ensinam ao mundo que a transmissão do vírus não será controlada apenas com vacinas. Levantar as restrições tão precocemente não terá sido um equívoco? O comportamento da sociedade seria responsável pela onda atual?

Hoje, a média de contatos interpessoais entre os ingleses é de três a quatro pessoas por dia; antes da pandemia era mais de 10. O uso de máscaras também foi reduzido depois que as restrições foram oficialmente suspensas. É muito provável que a liberação de eventos públicos em ambientes fechados tenha contribuído para os altos índices de transmissões no país.

Esses dados sugerem que a pressa em levantar restrições pode causar novas ondas, mesmo quando grande parte da população já está imunizada.

A alternativa para explicar o aumento do número de casos seria a queda progressiva da concentração de anticorpos protetores induzidos pela vacinação. Como o Reino Unido foi o primeiro, na Europa, a instituir campanhas de imunização, a imunidade induzida pela aplicação teve mais tempo para cair. Um estudo conduzido no país mostrou que depois de seis meses, a eficácia da vacina fica reduzida, especialmente nas pessoas com mais de 60 anos. Um estudo em Israel obteve resultados semelhantes.

Embora a variante Delta seja mais contagiosa, as vacinas continuam protegendo contra as hospitalizações e os óbitos. Entre julho e outubro deste ano, houve 75 mil internações, contra 185 mil entre outubro e janeiro de 2021. Relativamente ao número de habitantes, o Reino Unido tem três vezes mais infecções do que os Estados Unidos, mas dois terços de mortes diárias.

A administração da terceira dose parece conferir mais proteção ainda do que os cientistas ingleses esperavam. Estudo recente realizado em Israel demonstrou que cinco meses depois de haver recebido a terceira dose da vacina Pfizer, o risco de desenvolver doença grave tinha caído 20 vezes e o de ser infectado, dez vezes.

Entrevistado pela "Nature", Marc Baguelin do Imperial College London, especialista em modelagem epidemiológica, disse que as previsões mais otimistas baseadas no comportamento social e na eficácia das vacinas, permitem prever números altos de novas infecções até março de 2022. Nesse período, deverão ocorrer cerca de 43 mil hospitalizações e mais de 5 mil mortes, no Reino Unido.

A chegada do inverno europeu é uma preocupação a mais. A ampliação das aplicações da terceira dose são, agora, muito mais necessárias.

O anúncio feito pela Merck e pela Pfizer, de duas drogas capazes de reduzir o número de internações e de mortes, quando administradas até cinco dias contados a partir do surgimento dos primeiros sintomas, torna o tratamento precoce uma realidade capaz de mudar o curso da epidemia mundial, ao lado das vacinas, é claro.

DRAUZIO VARELLA